Podemos controlar a evolução da Miopia?
A miopia é uma condição ocular em que a pessoa tem dificuldade de ver ao longe. Geralmente é diagnosticada nos primeiros anos de escolaridade ou pelo início da adolescência. Tem uma tendência evolutiva durante alguns anos para depois estabilizar. Corrige-se facilmente com óculos e/ou lentes de contacto. Na maior parte dos casos é uma miopia de baixos valores que não trará outros problemas oculares. Numa minoria poderá atingir valores relativamente elevados com alterações nas estruturas oculares, nomeadamente na retina, com potencial de dano elevado.
Estudos nos últimos anos visam controlar a evolução da miopia. Pretende-se, com utilização continuada de gotas específicas (atropina em diluições específicas) ou óculos/lentes de contacto especializados, retardar a evolução desta condição que, em última análise e numa minoria de pessoas, poderá ter consequências algo gravosas para a função visual.
Presume-se que um quinto da população mundial era míope no ano 2000, e que aumentará para 50% no ano 2050.
A prevalência é muito maior nos países asiáticos. Singapura poderá ser o país com o maior número de míopes, estimando-se em cerca de 80% da população. Na China aponta-se para 30% de pessoas, sendo a prevalência maior nos liceus e universidades, quase 80%. Daí que a maioria dos estudos científicos são efetuados em países asiáticos onde a prevalência é elevada.
Na Europa e em Portugal as estimativas variam entre 20 e 40%, tendo provavelmente piorado no confinamento recente.
Imagina-se que o tempo passado dentro de casa em tablets, PCs, telemóveis possa ter um efeito relevante e sabe-se que há muitas vezes uma história familiar de miopia na família.
Por conseguinte, o tempo passado fora de casa poderá ter uma influência positiva no controle da progressão da miopia. Não se sabe se é significativo ou não, neste momento do conhecimento científico.
A miopia tende a estabilizar na fase final da adolescência e início da idade adulta. Daí que qualquer intervenção clínica deverá ocorrer numa fase precoce de vida.
Em 2023, J G Lawrenson e colegas publicaram um artigo em que comparavam vários tratamentos farmacológicos e óticos para retardar a progressão da miopia com um grupo controlador inativo (onde não houve qualquer intervenção clínica). Ao fim de um ano verificaram-se evidências positivas no efeito de algumas dessas atitudes terapêuticas, embora os estudos não fossem conclusivos. Os autores apelavam a estudos de longo prazo com uma base científica muito rigorosa para se poderem tirar conclusões definitivas.
Também no mesmo ano, Carla Lança e colegas publicaram um outro artigo de análise de 12 estudos que tinham sido efetuados entre 2019 e 2021 sob o mesmo tema. Verificaram que não existiam critérios científicos válidos para se decidir se e quando iniciar tratamentos com colírios ou lentes (óculos/lentes de contacto) especializadas para o efeito. Notou-se que a maioria dos oftalmologistas pediátricos tratariam as crianças com base na taxa subjetiva de progressão de miopia pois não era possível prever a sua progressão efetiva.
Sabe-se então que a aplicação de gotas de atropina em concentrações muito baixas e a utilização de óculos ou lentes de contacto especializadas poderão ter influência positiva no controlo da miopia.
Não se sabe, contudo, com evidência científica robusta e incontestada como, quando e por quanto tempo essas terapias devem ser utilizadas. Também ainda não se consegue explicar por que razão em alguns casos o efeito é o mesmo que a simples utilização de óculos de correção habituais e por que razão, noutros casos, há um retrocesso no controle após se parar o tratamento.
Presumimos que nesta fase do nosso conhecimento poderemos aconselhar a que se passe mais tempo em ambientes com luz natural e fora de casa e menos tempo em equipamentos que promovam a focagem ao perto ao longo de muitas horas. Este aconselhamento resulta de avaliações de estudos científicos que, em termos gerais, promovem um tempo equilibrado das crianças e jovens nos telemóveis e computadores para efeitos recreacionais para um bem estar geral.
No que respeita a tratamentos ativos da miopia, aconselhamos que sigam os conselhos do oftalmologista, sem muitas preocupações com possíveis terapias atuais porque – embora possivelmente úteis – ainda não se comprovou inequivocamente os seus efeitos a médio e longo prazo.
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